UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Lágrimas de Anjo



Se levantou do chão duro.
Dormiu escorado num muro,
enrolado num velho trapo,
com seu cão ao lado,
sem questionar o seu sono.
Acordou com a barriga roncando,
revirando as latas,
não encontrando nada,
capaz de sossegar sua fome.
Ninguém o levou pra escola.
Fica vagando pedindo esmola,
na rua selvagem,
admirando na outra margem,
uma vitrine de loja.
Ele se escora no vidro,
sonhando quietinho,
com o boneco ou carrinho.
Queria ser forte como aquele herói.
Não chorar quando dói,
a indiferença dos estranhos,
quando leva dos que tem maior tamanho,
uma surra por não ter feito nada.
Solitário, volta pra estrada.
Queria entender sua culpa,
saber se a vida era justa,
sem lhe conceder um prato de comida.
Ninguém sara sua ferida.
Agora, ele já está cansado.
Volta a estar deitado,
no muro que ninguém lembra.
Aquele é seu canto,
acostumado com seu pranto,
de criança que ninguém acalenta.
É apenas um anjo perdido,
que chora escondido,
a ignorância dos homens.

(Autor: Cristian Ribas)

Nenhum comentário: