UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

domingo, 28 de agosto de 2011

Até o fim


Mas é assim o poema:
construído devagar,
palavra a palavra,
e mesmo verso a verso,
até ao fim.
O que não sei é como acabá-lo;
ou, até, se o poema quer acabar.
Então, peço-te ajuda:
puxo o teu corpo
para o meio dele,
deito-o na cama da estrofe,
dispo-o de frases
e de adjetivos até te ver,
tu,
o mais nu dos pronomes.
Ficamos assim.
Para trás, 
palavras e versos, 
e tudo o que
não é preciso dizer:
eu e tu,
chamando o amor
para que o poema acabe. 

(Autor: Nuno Júdice)

Nenhum comentário: