UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O Palhaço



Ontem, viu-se-lhe em casa a esposa morta
E a filhinha mais nova, tão doente!
Hoje, o empresário vai bater-lhe à porta,
Que a platéia o reclama, impaciente.

Ao palco, em breve surge... pouco importa
O seu pesar àquela estranha gente...
E ao som das ovações que os ares corta,
Trejeita, canta e ri, nervosamente.

Aos aplausos da turba, ele trabalha
Para encontrar no manto em que se embuça
A cruciante angústia que o retalha.

No entanto, a dor cruel mais se lhe aguça
E enquanto o lábio trêmulo gargalha,
Dentro do peito o coração soluça.

(Autor: Padre Antônio Tomaz)

Nenhum comentário: