UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quinta-feira, 30 de julho de 2009

LIVRO: Longe daqui


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Amy Bloom

Sinopse: Nos anos 1920, a jovem Lillian Leyb deixa a Rússia para trás após perder toda a família num sangrento e traumático massacre. Parte rumo à América dos sonhos, mas desembarca num mundo onde é obrigada a dividir pão e repolho com estranhos dentro de um cômodo sujo e apertado. Um dia, após receber a notícia de que sua querida filha Sophie está viva, Lillian retoma o caminho de volta pelo Alasca rumo à Sibéria. Uma jornada de cores e sombras através dos Estados Unidos do começo do século XX. Longe daqui é um romance belo e arrebatador.

“No romance de Amy Bloom, uma frase pode ser mais significativa do que livros inteiros.”
– The New Yorker

Longe daqui de Amy Bloom é inspirado em uma história real. Em uma narrativa pouco usual, vemos descortinar a história de Lillian Leyb uma imigrante judaica que, fugindo do massacre russo em 1924, tenta sobreviver em Nova York.

No romance vemos as palavras se esparramarem incontidas, encorpadas e densas para narrar uma história passada nos tempos modernos mas, impregnada de qualidades épicas com seus ares clássicos e profundos. A autora emprega esses elementos de forma palpável agregando insights psicológicos, muito sexo e um senso de humor essencialmente judaico.

À primeira vista, espantei-me com a fala rápida e conturbada do narrador onisciente. No entanto, é por intermédio dessa onisciência detentora do tempo e da ação da história que ao leitor é possível conhecer os acontecimentos futuros antes mesmo dos personagens. Desse modo, devido à contextura engenhosa do texto, pode-se presenciar a narrativa ativamente. E essa sensação é que me fez, após o estranhamento inicial, descobrir-me imersa nessa história emocionante e dramática.

A odisséia de Lillian é bastante singular, pois, além da travessia física que ela empreende em busca da filha perdida, tem-se a longa perambulação da alma angustiada e anestesiada. Lillian é um personagem muito bem construído, principalmente, no que tange a sua construção psicológica. A ausência de Lillian não é só física, não é somente ditada pela a separação de sua pátria. A ausência de Lillian é sobretudo, psicológica e emotiva. E entendendo isso, é que se pode compreender a anti-heroína, a mulher comum nela representada.

E, se para alguns, assim como eu, as passagens relativas ao sexo e a prostituição pareça ser explorada em demasia pela autora, é preciso, por outro lado, visualizá-las no contexto amplo em que Lillian se situa. Isto é, na perspectiva da irredutível vontade que é maior do que o orgulho humano e o amor próprio. Na perspectiva de um amor incondicional é onde, então, o poder da empatia prevalece. E não se engane, mesmo diante de uma realidade crua e violenta exposta ao longo da narrativa, é plausível que o amor seja encontrado em esquinas improváveis por razões distintas ou por nenhuma razão sequer.

Tais fatores fazem com que se anseie chegar ao final com a expectativa da redenção consagrada, com expectativa da chegada à terra prometida de onde, certamente, procederá a felicidade plena. Mas, o final nada óbvio da história é genial e condizente com o todo, bane as soluções simplistas, ao inserir a idéia de que a jornada da vida nunca se esgota.

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