UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Definitivo Íntimo

I
O que me palpita em ti é a VIDA,
não o espírito
Quando te entregas não- te- entregando
esqueço as portas batidas nas caras dos funcionários humildes
a empáfia que outros vermes vão roer
os esquemas universitários em torno da literatura
os publicitários
os gendarmes os campos de concentração a
guerra bacteriológica
o napalm e o ônibus espacial
a loucura aliada ao gênio
e a inata falta de talento servida pela propaganda
Esqueço a minha própria circunstância
quando em teu braço meço
as nossas respirações sincopadas
Os nossos cabelos se unem
Do teu as ondas mansas
me fazem perguntar
o porquê da leveza,
dos tons ligeiramente diferentes
em certas pontas ou mechas
como castanhas mordidas pelo sol.

II
Vais levantar agora? perguntas
Não vens deitar aqui? perguntas
E ninguém disse, em cinco mil anos de escrita,
poema melhor
Depois, tento conter no mesmo tempo
a tempestade e a explosão num sincronismo difícil
É um aprendizado de paciência milimetrada
este da igualação dos nossos paroxismos
que decorre entre o início
e o ápice da felicidade
Tudo vem da raiz dos teus pés em que flores do
campo fizeram morada
da escultura de teu efêmero e eterno corpo de
mármore
E por fim de dizeres que me adoras
e que eu não posso deixar de sabê-lo
Os anos passam sobre esta inconseqüência
certíssima e fatal
que nos coloca acima de todos os mortais.

III
Isto me faz maior que eu.

(Autor: Zeferino Fagundes)

Nenhum comentário: