UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

domingo, 22 de agosto de 2010

Meta

Dispenso o emaranhado de tristeza.
Jogo a saudade sobre a mesa,
grudo os desapontos no teto.
Passo reto, abro alas.
Arrombo portas, devasso salas,
empurro mágoas pendentes no corredor.
Recolho um favor que, desprezado,
jaz no canto, roto e desbotado,
encosto de um lado um desafeto.
Abro alas, passo reto.
Banho-me lá fora
com a gota de lua caída da aurora,
e lavo minha história.
Quando enxuta,
divisam-se glórias impolutas.
Descubro-me mulher, guerreira, artista
e bato palma.
Abro meus braços, lavo a alma;
percebo logo ali um sol nascente.
Meu passo é reto,
abro alas.
Sigo em frente.

(Autora: Flora Figueiredo)

Nenhum comentário: