UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sábado, 11 de agosto de 2012

A Fonte e a Flor



Deixa-me, fonte, dizia,
A flor, tonta de terror,
E a fonte, rápida e fria,
Cantava, levando a flor.
Deixa-me, deixa-me, fonte,
Dizia a flor, a chorar.
Eu fui nascida no monte,
Não me leves para o mar!
E a fonte, rápida e fria,
Com um sussurro zombador, 
por sobre a areia corria, 
Corria, levando a flor.
"Ai, balanços do meu galho,
Balanços do berço meu,
Ai, claras gotas de orvalho,
Caídas do azul do céu!"
"Carícias das brisas leves
Que abrem rasgões de luar,
Fonte, fonte, não me leves,
Não me leves para o mar!"
.........
As correntezas da vida
E os restos do meu amor
Resvalam numa descida
Como a da fonte e da flor...

(Autor: Vicente de Carvalho)

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