UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sábado, 21 de maio de 2011

Pela flor amarela viajaremos



Pela flor amarela viajaremos:
afastaremos as nuvens espessas
e as florestas de espinhos.

Pela flor amarela, vamos e voltamos,
por escadas escuras, corredores estreitos,
falando a desconhecidos.

Onde está, dizei-nos, a flor amarela?
Era minha? Era vossa? era do seu próprio instante,
era sua, cativa por algum caçador floral?

Pela flor amarela atravessaremos a pedra,
o vidro, o metal, as palavras.
Atravessaremos o coração, como quem se mata.

Atravessaremos um novo mar desconhecido,
correremos Áfricas e Ásias, pólo e trópico,
e jogaremos nossa vida entre as estrelas.

A flor amarela está guardada em si mesma,
seu perfume, sob mil pétalas tranquilas,
seu pólen resguardado contra o vão descobrimento.


(Autora: Cecília Meireles)

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