UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

LIVRO: A Chave de Sarah


Category:Books
Genre: Literature & Fiction
Author:Tatiana de Rosnay

Sinopse: "Julia Jarmond é uma jornalista americana que vive em Paris há 25 anos e é casada com o arrogante e infiel Bertrand Tézac, com quem ela tem uma filha de onze anos. Julia escreve para uma revista americana, e seu editor pede que ela cubra o sexagésimo aniversário da grande concentração no Vélodrome d’Hiver - um estádio no qual dezenas de milhares de judeus ficaram presos antes de serem enviados para Auschwitz. Ao se aprofundar em sua investigação, Julia constata que o apartamento para o qual ela e o marido planejam se mudar pertenceu aos Starzynski, uma família judia imigrante que fora desapossada pelo governo francês da ocupação, e em seguida comprado pelos avós de Bertrand. Ela resolve descobrir o destino dos ocupantes anteriores. É revelada então a história de Sarah, a única sobrevivente dos Starzynski a sobreviver. Ao escrever sobre o passado da França, Tatiana de Rosnay oferece em 'A Chave de Sarah' um retrato da França sob a ocupação nazista, revelando tabus e negações que circundam este doloroso período da História francesa".

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Sempre gostei das leituras que me remetem aos fatos históricos, em especial, aos menos comentados e conhecidos. O episódio que serve de mote para o livro foi um acontecimento da história francesa que, até hoje, permanece na obscuridade. Não há vontade de lembrar um momento terrível, que só gerou morte e dor. É algo que precisa ser apagado da mente daqueles que recordam, e deve ser negado aos mais jovens, como matéria proibida. Caberá a uma das personagens do livro trazer à tona a voz daqueles que sucumbiram ao terror da Segunda Guerra Mundial.

O livro nos conta a história de Sarah, a sobrevivente da tragédia do Vel d'Hiv. Nesse estádio francês foram presas diversas pessoas judias, incluindo-se crianças, que eram maioria. No início, vítima da guerra, depois uma guerreira ainda menina, Sarah se fortalece para realizar uma missão, resgatar o irmão. Os sentimentos da garotinha estão presentes com força na narrativa, que é em primeira pessoa. Ela nos emociona à medida que nos descreve, com riqueza de detalhes, as condições degradantes pelas quais passou durante o encarceramento no estádio, com milhares de pessoas, em sua maioria, mulheres e crianças, até a sua fuga em busca do irmão. É chocante observar a maneira como eram tratados os judeus, até mesmo os de meses de idade, relegados ao ostracismo, sem comida, sem água. Por diversas vezes, indignei-me, fiquei triste e deixei as lágrimas correrem.

Na época atual, há a história de Julia, a americana que reside na França há muitos anos. Casada com um francês charmoso, de família influente e tradicional, a jornalista encontra dificuldades em se situar dentro da rigidez e dos costumes franceses. O choque de idéias fica ainda maior quando ela é designada para uma reportagem que lembrará os 60 anos do Massacre do Vel d'Hiv. Todos os familiares franceses se voltam contra ela e a acusam de estar difamando a França por ser americana. Mas, ela não imagina que a família tem outros motivos para desejar que sua reportagem não aconteça. Julia não retrocede na sua tumultuada pesquisa, e, ao saber que Sarah sobreviveu, o impacto da história da menina será transformador para sua própria vida. Para as duas personagens, há uma profusão de acontecimentos inesperados que vão ditando os rumos de forma surpreendente. Para o leitor, é uma leitura absorvente. Um livro muito emocionante, para refletir. Recomendo com prazer.

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