UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

A Lenda do Amor



Era uma vez o amor...
O amor morava numa casa
assoalhada de estrelas
e toda enfeitada de sóis.
Mas não havia luz na casa do amor,
porque a luz era o próprio amor.

E então o amor queria uma casa mais linda para si!
- Que estranha mania essa do amor!
E fez a terra,
e na terra fez a carne,
e na carne soprou a vida,
e na vida imprimiu
a imagem da sua semelhança.
E a chamou de ser humano.
E, dentro do peito do ser humano,
o amor construiu a sua casa,
pequenina, mas palpitante,
inquieta e insatisfeita com o próprio amor.
E o amor foi morar
no coração do ser humano
e coube todinho lá dentro,
porque o coração do ser humano foi feito para o infinito.

Uma vez, o ser humano ficou com inveja do amor.
Queria para si a casa do amor, só para si,
como se o amor pudesse viver só.
E o ser humano sentiu uma fome torturante e comeu!...

O amor foi-se embora do coração do ser humano.
O ser humano começou a encher seu coração:
encheu-o com a riquezas da terra e ainda ficou vazio.

E o ser humano, triste, derramou suor para ganhar a comida.
Ele sempre tinha fome e continuava com o coração vazio.
E, uma vez, resolveu repartir seu coração inútil com as criaturas da terra.
O amor soube... Vestiu-se de carne
e veio também receber o coração do ser humano.

Mas o ser humano reconheceu o amor e o pregou numa cruz.
E continuou a derramar o suor para ganhar a comida.
O amor então teve uma idéia:
vestiu-se de comida, disfarçou-se de pão e ficou quietinho.
Quando o ser humano
faminto ingeriu a comida,
o amor voltou à sua casa, no coração do ser humano.

E o coração do ser humano se encheu de plenitude.

(Autor Desconhecido)

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