UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA
Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.
Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.
Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]
(Autor: Fernando Pessoa)
Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.
Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.
Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]
(Autor: Fernando Pessoa)
quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012
terça-feira, 28 de fevereiro de 2012
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
Canção
No desequilíbrio dos mares,
as proas giram sozinhas...
Numa das naves que afundaram
é que certamente tu vinhas.
Eu te esperei todos os séculos
sem desespero e sem desgosto,
e morri de infinitas mortes
guardando sempre o mesmo rosto.
Quando as ondas te carregaram
meu olhos, entre águas e areias,
cegaram como os das estátuas,
a tudo quanto existe alheias.
Minhas mãos pararam sobre o ar
e endureceram junto ao vento,
e perderam a cor que tinham
e a lembrança do movimento.
E o sorriso que eu te levava
desprendeu-se e caiu de mim:
e só talvez ele ainda viva
dentro destas águas sem fim.
as proas giram sozinhas...
Numa das naves que afundaram
é que certamente tu vinhas.
Eu te esperei todos os séculos
sem desespero e sem desgosto,
e morri de infinitas mortes
guardando sempre o mesmo rosto.
Quando as ondas te carregaram
meu olhos, entre águas e areias,
cegaram como os das estátuas,
a tudo quanto existe alheias.
Minhas mãos pararam sobre o ar
e endureceram junto ao vento,
e perderam a cor que tinham
e a lembrança do movimento.
E o sorriso que eu te levava
desprendeu-se e caiu de mim:
e só talvez ele ainda viva
dentro destas águas sem fim.
(Autora: Cecília Meireles)
Perguntarão pela Tua Alma
Perguntarão pela tua alma
a alma que é ternura,
tristeza,
amor.
Mas tu mostrarás a
alma do teu vôo.
Livre por entre os mundos...
E eles compreenderão
Que é um segundo corpo,
e mais amargo,
porque não se pode mostrar,
porque não se pode ver...
(Autora: Cecília Meireles)
Eu quero amar perdidamente
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
(Autora: Florbela Espanca)
Nel mezzo del camim*
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
e a alma de sonhos povoada eu tinha...
E paramos de súbito na estrada da vida
longos anos, presa a minha a tua mao,
a vista deslumbrada tive
da luz que no teu lhar continha.
Hoje, segues de novo... Na partida
nem o pranto os teus olhos umedece,
nem te comove a dor da despedida.
E eu solitário, volto a face e tremo,
vendo o teu vulto que desaparece
na extrema curva do caminho extremo.
(Autor: Olavo Bilac)
______________
* Este soneto chama atenção pelo título, pois dialoga com A Divina Comédia, de Dante Alighieri, através da citação (uma forma de marcar a intertextualidade) do primeiro verso desta obra.
Nel mezzo del camin de nostra vita
mi retrovai por una selva oscura:
ché la viritta via era smarrita
(A meio caminho de nossa vida
fui me encontrar em uma selva escura:
estava a reta a minha via perdida.)
Quanto...
Quantos mistérios escondes
Atrás dos olhos atraentes;
Quantas delícias ocultas
Em teus lábios sorridentes;
Quantas coisas não respondes
Às minhas questões incultas.
Quanto pareces fascinante
Aos meus olhos enamorados;
Quanto conheces do medo
Em meus lábios apaixonados;
Quanto pareces brilhante
Atrás do grande segredo...
Quanto escondes do céu
Na palavra cautelosa;
Quanto descubro de ti
Quando sorris maravilhosa,
Com sabor de sol e mel;
E de vida que eu não vivi...
Quanto desvendas de mim,
Enquanto te cobres desenvolta,
Quanto me sabes descobrir,
Dessa forma tão leve e solta
Que eu me entrego assim;
Sem forças para reagir...
Quantos sorrisos terás
Sobre as lágrimas choradas,
Quantas perguntas terei
Sobre as respostas negadas,
Quanto de mim deixarás
Do tudo que eu já te amei...
Atrás dos olhos atraentes;
Quantas delícias ocultas
Em teus lábios sorridentes;
Quantas coisas não respondes
Às minhas questões incultas.
Quanto pareces fascinante
Aos meus olhos enamorados;
Quanto conheces do medo
Em meus lábios apaixonados;
Quanto pareces brilhante
Atrás do grande segredo...
Quanto escondes do céu
Na palavra cautelosa;
Quanto descubro de ti
Quando sorris maravilhosa,
Com sabor de sol e mel;
E de vida que eu não vivi...
Quanto desvendas de mim,
Enquanto te cobres desenvolta,
Quanto me sabes descobrir,
Dessa forma tão leve e solta
Que eu me entrego assim;
Sem forças para reagir...
Quantos sorrisos terás
Sobre as lágrimas choradas,
Quantas perguntas terei
Sobre as respostas negadas,
Quanto de mim deixarás
Do tudo que eu já te amei...
(Autor: José Carlos Rodrigues)
Adeus
Como se houvesse uma tempestade
escurecendo os teus cabelos,
ou se preferes, a minha boca nos teus olhos,
carregada de flor e dos teus dedos;
como se houvesse uma criança cega
aos tropeções dentro de ti,
eu falei em neve, e tu calavas
a voz onde contigo me perdi.
Como se a noite viesse e te levasse,
eu era só fome o que sentia;
digo-te adeus, como se não voltasse
ao país onde o teu corpo principia.
Como se houvesse nuvens sobre nuvens,
e sobre as nuvens mar perfeito,
ou se preferes, a tua boca clara
singrando largamente no meu peito.
escurecendo os teus cabelos,
ou se preferes, a minha boca nos teus olhos,
carregada de flor e dos teus dedos;
como se houvesse uma criança cega
aos tropeções dentro de ti,
eu falei em neve, e tu calavas
a voz onde contigo me perdi.
Como se a noite viesse e te levasse,
eu era só fome o que sentia;
digo-te adeus, como se não voltasse
ao país onde o teu corpo principia.
Como se houvesse nuvens sobre nuvens,
e sobre as nuvens mar perfeito,
ou se preferes, a tua boca clara
singrando largamente no meu peito.
(Autor: Eugénio de Andrade)
Labirintos
Há um momento
em que os lábios espantam
o desejo das horas, e traduzem
a incerteza da vida.
Os olhos, vagos,
por sob as pálpebras,
escondem a dormente tristeza
dos trilhos não viajados.
E as mãos,
atadas pelo silêncio do dia,
guardam as sombras dos gestos
no labirinto dos pensamentos
não revelados.
Há um momento
em que o mundo é sem tempo...
e tudo é por demais irreal
para que se cogite dos sonhos!
em que os lábios espantam
o desejo das horas, e traduzem
a incerteza da vida.
Os olhos, vagos,
por sob as pálpebras,
escondem a dormente tristeza
dos trilhos não viajados.
E as mãos,
atadas pelo silêncio do dia,
guardam as sombras dos gestos
no labirinto dos pensamentos
não revelados.
Há um momento
em que o mundo é sem tempo...
e tudo é por demais irreal
para que se cogite dos sonhos!
(Autor: Francisco Lins do Rego Santos)
Anjo das Horas
A ti , meu Anjo , amor dos meus encantos,
A ti que velas horas dos meus dias,
A ti que trazes luz aos meus espantos,
Eu agradeço o fim das agonias.
As agonias que rondaram cantos,
Os mais escuros de paredes frias,
Quando era eu um carrilhão de prantos,
E tu - de perto - só me percebias.
Sem que eu chamasse foste os acalantos
Das minhas noites tristes e vazias.
E eu que chamava por todos os santos,
Não via a ti que tanto me sorrias.
A ti, meu Anjo , amor dos meus encantos,
Eu agradeço os meus presentes dias.
(Autora: Silvia Schmidt)
A ti que velas horas dos meus dias,
A ti que trazes luz aos meus espantos,
Eu agradeço o fim das agonias.
As agonias que rondaram cantos,
Os mais escuros de paredes frias,
Quando era eu um carrilhão de prantos,
E tu - de perto - só me percebias.
Sem que eu chamasse foste os acalantos
Das minhas noites tristes e vazias.
E eu que chamava por todos os santos,
Não via a ti que tanto me sorrias.
A ti, meu Anjo , amor dos meus encantos,
Eu agradeço os meus presentes dias.
(Autora: Silvia Schmidt)
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