UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Chagas de Amor

 
Esta luz, este fogo que devora.
Esta paisagem gris que me rodeia.
Esta dor por fixar-me numa idéia.
Esta angústia de céu, de mundo, de hora.

Este pranto de sangue que decora
lira já sem vigor, lúbrica teia.
Este peso do mar que me golpeia.
Esta lacraia que em meu peito mora.

São grinaldas de amor, chão de ferido
onde me deito e sonho-te a presença
nas ruínas de meu peito já destruído.

E embora eu aja na maior prudência,
me dá teu coração vale estendido
com cicuta e paixão de amarga ciência.


(Autor: Federico Garcia Lorca)

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