UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Soneto da Contemplação


Claro espasmo de ritmos e de cores.
Branco esplendor da força, desatada
nos cânticos, nos prantos, nos clamores
da imensa arquitetura instável. Cada

síntese dos abismos são rumores
de líquido tropel. Desordenada,
a memória das águas: estertores
escachoantes na terra violentada.

A consciência do ser tímida e atônita
no pânico suicida, pobre presa
de íntima pequenez, mágoa recôndita.

De súbito, a emoção do êxtase alado:
paira pairando, a límpida beleza
do vôo azul de um pássaro calado.

(Autor: Waldemar Lopes)

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