UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Substractum


Formoso ideal com que a sonhar me iludo
- Fraternidade humana vã doutrina
O homem só por si próprio se fascina,
- Narciso eterno, eis seu mistério rudo.

O beijo, o abraço, o adeus, o aplauso... tudo
O que oferece, quando raciocina,
São só disfarces da feição genuína
Do seu caráter cego, surdo, mudo!

Amizade, respeito, simpatia,
Misericórdia, amor, saudade, ciúme.
Tudo acaba, se o egoísmo principia.

E o homem, vivendo entre outros homens, a esmo,
Vê que a vida, afinal, se lhe resume
No profundo deserto de si mesmo!

(Autor: Luís Carlos da Fonseca Monteiro de Barros)

Nenhum comentário: