UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sábado, 4 de abril de 2009

TERÇA-FEIRA SANTA (SEMANA SANTA)

Depois de O terem escarnecido, tiraram-Lhe a clâmide, vestiram-Lhe as suas roupas e levaram-n'O para ser crucificado. À saída, encontraram um homem de Cirene, chamado Simão, e obrigaram-no a levar a cruz de Jesus, e chegaram a um lugar chamado Gólgota, isto é, lugar da Caveira.
(Mt 27, 31-33)

+ Eu vos adoro e bendigo, ó Jesus, que remistes o mundo pela vossa cruz.
+ Ensinai-me, Jesus, as lições da cruz, que me prega a reparação e o amor.

Suplício doloroso e ignominioso

Jesus leva com grande dor esta cruz: bajulans sibi crucem. Ela é pesada, esta cruz, mais do que o comportam as forças de um homem, e Jesus já está esgotado pela sua agonia no Jardim das Oliveiras, por todas as impressões desta noite, na qual foi traído, julgado, abandonado, pelo jejum, pela flagelação, a coroação de espinhos e os maus tratos de todo o gênero. A cruz repousa sobre as suas chagas, abertas sobre os seus ombros pela flagelação.
E tudo isto ainda não seria nada, se a cruz não representasse para Ele o peso de todos os nossos pecados, cuja carga Ele assumiu.
É um suplício ignominioso. Jesus é assemelhado lá aos mais vis culpados, aos escravos criminosos. Está enquadrado entre dois malfeitores, ladrões e assassinos. Atravessa toda a cidade que O escarnece e despreza. Um arauto público precede-O e anuncia a sua condenação. Era o costume. Os fariseus e os sacerdotes seguem-n'Os triunfantes. A multidão é imensa, pois é o tempo das festas da páscoa. Tanto que O aclamavam dias antes, tanto O desacreditam hoje.
Jesus pode aplicar a si as palavras de Jeremias: "Vós que passais no caminho, vede se é possível imaginar-se dor semelhante à minha!" (Lam 1, 12).

Os encontros

Ao longo do caminho doloroso, sucedem-se os encontros emocionantes.
É, em primeiro lugar, Simão de Cirene, que se resigna dificilmente a ajudar Jesus. Ele representa-nos a todos. Vendo-o, Jesus pensa em nós, nas nossas repugnâncias pela cruz salutar, nas nossas recusas habituais a compadecer com a sua cruz e ajudá-l'O. Este pensamento aumenta imensamente os seus sofrimentos.

Depois, é Maria, que se adianta, acompanhada e apoiada em S. João. Vê-los chorar e sofrer é para o Coração de Jesus um acréscimo de dor. Quem é que não quereria esconder as próprias dores a sua mãe, para a não fazer sofrer? Maria vai seguir Jesus até ao Calvário, Jesus vai sofrer duplamente. Entretanto, Maria é lá o nosso modelo. Ela esquece-se de si mesma e dá a Jesus tudo o que o seu Coração pode esperar: compaixão, reparação, amor, gratidão. Caminhemos com ela, imitemo-la, consolemo-la como fazia S. João.


Jesus encontra Verônica que enxuga a sua face divina; é mais um modelo para as almas reparadoras. Verônica enxuga o sangue que corre da fronte de Jesus, os escarros ignóbeis dos soldados, o pó do caminho, o suor provocado pela fadiga. Que tema fecundo de contemplação! Como é feliz esta mulher por assim ajudar e consolar Jesus! E se nós quisermos, podemos ter a mesma graça, pelos nossos atos de compaixão, de reparação, de retratação, cumpridos com afeição e generosidade.

Jesus encontra então as filhas de Jerusalém. Elas choram com uma compaixão muito natural e feminina. Nosso Senhor adverte-as que isso é insuficiente, que é preciso chorar por causa das nossas faltas e pôr fim aos nossos pecados, que são a verdadeira causa dos seus sofrimentos e de toda a sua paixão. Que lição para nós! A melhor compaixão por Jesus é não pecar e viver mais santamente.

Também nós devemos levar a nossa cruz

O próprio Senhor nos deu um preceito: "Quem não leva a sua cruz, não é digno de mim", diz-nos. Não devemos então conformar-nos, de fato, com o nosso chefe? Se Nosso Senhor escolheu a cruz, é porque ela é boa, é porque é necessária.
Ela repara, apaga o pecado. Adquire as graças; e em nós, ela comprime as paixões e enfraquece-as.
É tão necessária, que Nosso Senhor fez dela a medida da nossa glória. Quando nos vier julgar, o sinal da redenção planará no céu. Os que se tiverem conformado com a cruz serão salvos.
Aliás, toda a vida está semeada de cruz, aí está a condição da nossa vida mortal desde a queda de Adão. Seria uma loucura não aproveitar destas ocasiões de reparação e de mérito.

Como é que devemos levar a cruz? Primeiro com resignação, como Jesus, que dizia sem cessar: "Meu Pai, que a vossa vontade seja feita e não a minha!"
- Com confiança na graça de Jesus Cristo que nos ajudará a levar a cruz.
- Com alegria, porque a cruz é o caminho do céu.
- Com amor, sobretudo, porque a cruz nos torna semelhante a Jesus Cristo, porque a nossa generosidade consola o Coração de Jesus e une-nos ao Salvador na sua obra redentora, porque as nossas cruzes, levadas com coragem são fontes de graças para todas as nossas obras, para todas as almas que nós recomendamos a Nosso Senhor.

+ Resoluções - A cruz é um mistério, ela repugna à natureza, mas tem segredos de graça e de força. É preciso amá-la com sabedoria, sem anteceder a graça de Nosso Senhor. Podemos por nós mesmos abraçar a mortificação com prudência, na medida das nossas forças. E quanto às cruzes da Providência nós podemos contar com o socorro de Nosso Senhor, cujo Coração está cheio de bondade e de misericórdia.
+ Colóquio com Jesus levando a cruz.

Nenhum comentário: