UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quarta-feira, 22 de abril de 2009

O umbigo nosso de cada dia!


Cada um com o seu. O umbigo nosso de cada dia. Em torno do qual tudo gira tudo, acontece, tudo permanece. E somos deuses com nossos umbigos, preocupados que estamos com nossos negócios, nossas mazelas, nossa escuridão, nossa podridão. Não, ninguém há de saber o que se passa, pois somos só nós e nossos umbigos. Os senhores da vida e da palavra. Donos da verdade e da falta dela quando convém. Donos da dignidade que ninguém vê. Passeamos com os pés acorrentados aos fantasmas do passado, e as marcas? Juramos que ninguém as tem tão profundas e sulcadas, sangrando nossa última gota do sangue já gelado. Ninguém. Não olhamos para o lado, para o que agoniza caído ao chão, não. Porque nossa dor, ora, é infinitamente maior. Quem é fulano, com seu umbiguinho tão pequenininho para se achar no direito de sofrer mais, ou acreditar que sua dor seja maior? Não. Gente estúpida!Quanta gente estúlpida! Restamos eu, e meu umbigo. E a dor, que é minha por merecimento.

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