UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

domingo, 26 de abril de 2009

LIVRO: Esperando por Godot - Título original: Waiting for Godot


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Samuel Beckett

Nesta peça do dramaturgo irlandês Samuel Beckett, os personagens se põe a dialogar sobre banalidades enquanto esperam inutilmente uma figura que nunca chega, o Godot do título. Nesses diálogos, sente-se toda a solidão e desolação do ser humano atirado num mundo onde, como dizia Sartre, não há nada de inteligível no céu. Os personagens tentam comunicar-se, há um esforço enorme de entendimento e compreensão, mas a comunicabilidade, para os personagens beckettianos, é algo inacessível. O desespero dos personagens em comunicar o vazio e em esperar o nada é a denúncia que faz Beckett do absurdo da existência humana; luta-se para preencher a vacuidade. Em dado momento, há gritos e gemidos loucamente ininteligíveis; são como uma espécie de vagido do “teatro do absurdo”, como chamaram esse tipo de experiência teatral, que parece buscar e ensaiar uma caça aos limites da palavra, aos abismos do insondável e do que o ser humano tem de mais superficial e sórdido. Desse lama, tenta-se tecer uma poética da incomunicabilidade. A pobreza do enredo, onde as coisas não acontecem entre os personagens, revolucionou o teatro de seu tempo, reduzindo o espetáculo e dando origens às peças pocket de nossa época. A proposta parece desejar reduzir a cenografia ao mínimo para maximizar a rudeza do sofrimento, a imensidade da solidão e a intensidade do drama. Na época em que a peça foi lançada, muitos julgaram que Godot era um símbolo de Deus, e viu-se na palavra “God” um jogo intencional com esse significante. Hoje pode-se dizer que há um livre deslizar de significantes nessa peça, talvez muito longe do significado mítico-religioso que parte da crítica quis dar a essa peça.

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