UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Nuvens ao Vento

No céu de um azul profundo
as nuvens baixas, brancas, esgarçadas,
ameaçam como patas de dragão.
Giram, circunvolvem, assustam
como se fossem anti-gravuras de Dürer,
a Morte, mas a Morte branca, de algodão e sonho.

As nuvens giram, fiapos iluminados de sol,
em pleno topo do céu.
Arquipélagos convulsos, luminosos.

O vento agita o salgueiro e o liquidâmbar.
No jardim as estátuas se oferecem nuas,
nuas de um branco terreno, sem a luz das nuvens.

Nada mais belo existe,
e a vida é um dom azul, um dom azul e branco.
Neste momento somos deuses,
deuses que temos por limite
a nossa própria pele e o azul do céu.

O tempo arredondou-se azul:
parou no azul do céu
girando como nuvem
cujo movimento fosse a pausa.
Enquanto dura a pausa, somos imortais. Imóvel
é o presente, e nele nos cravamos.

(Autor: Péricles Eugênio da Silva Ramos)

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