UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

domingo, 28 de julho de 2013

Como os passivos afogados

Esperando o tempo da areia
pelo mar de inúmeros lados
bóio tão venturosa e alheia
que,para mim, a noite e o dia
têm o mesmo sol sem ocaso,
e o que eu queria e não queria
aceitaram seu justo prazo

E nem me encontra quem me espera
nem o que esperei foi havido,
tanto me ausento desta esfera.

Ó liberdade sem tormento!
(Ó fitas soltas, ó cortinas
Levadas por um amplo vento
além de campos e colinas!...)
Vencendo sucessivos planos,
abrindo mundo encobertos
chegando ao reinos sobre-humanos
onde há jardim para os desertos!

A alma do sonho fez-se ouvido
tão vertiginoso e profundo
que capta o recado perdido
dos ocultos donos do mundo.

(Autora: Cecília Meireles)

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