UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

domingo, 28 de julho de 2013

Descrença

Trago em meus frios lábios a tristeza
Da fonte que a cantar emudeceu;
A voz que outrora se elevava ao céu
Nos meus lábios murchou e já não reza.

Ai daquele que um dia em fé acesa
A Deus a alma entristecida ergueu,
E, descrente bem cedo, se perdeu
Na mais cruel e trágica incerteza!

Nos meus olhos as lágrimas secaram,
Nos meus lábios as rezas se calaram...
Ó meu deserto olhar, lábios desertos!

Para que, para que tanta amargura,
Se não tem eco a voz que em mim murmura,
Nem água estes meus olhos sempre abertos?

(Autor: Anrique Paço D’Arcos)

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