UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sábado, 13 de novembro de 2010

Envelhecer

Na manhã da existência, ouvindo o peito,
que previa teu vulto no caminho,
dentro em minha alma levantei teu ninho,
 e, nesse ninho, preparei teu leito.
Desceu a tarde, e ainda me viu sozinho.
 Murcham as flores, que, de leve, ajeito;
 de novas rosas tua colcha enfeito,
e o travesseiro, novamente, alinho.

Cai, tristonho, o crepúsculo, na estrada.
Alongo os olhos, atirando um beijo
 à forma vaga do teu corpo... E nada!

Recomponho as palavras que não disse.
 E, apagando a candeia do Desejo,
 adormeço na noite da Velhice.

(Autor: Humberto de Campos)

Nenhum comentário: