UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

sábado, 13 de novembro de 2010

Amor, que o gesto humano na alma escreve



Amor, que o gesto humano na alma escreve,
Vivas faíscas me mostrou um dia,
Donde um puro cristal se derretia
Por entre vivas rosas e alva neve.


A vista, que em si mesma não se atreve,
Por se certificar do que ali via,
Foi convertida em fonte, que fazia
A dor ao sofrimento doce e leve.


Jura Amor que brandura de vontade
Causa o primeiro efeito; o pensamento
Endoidece, se cuida que é verdade.


Olhai como Amor gera, num momento
De lágrimas de honesta piedade,
Lágrimas de imortal contentamento.

(Autor: Luís Vaz de Camões)

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