UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Soneto de Carnaval

Distante o meu amor, se me afigura 
O amor como um patético tormento 
Pensar nele é morrer de desventura 
Não pensar é matar meu pensamento.

Seu mais doce desejo se amargura 
Todo o instante perdido é um sofrimento
Cada beijo lembrado é uma tortura 
Um ciúme do próprio ciumento. 

E vivemos partindo, ela de mim 
E eu dela, enquanto breves vão-se os anos 
Para a grande partida que há no fim

De toda a vida e todo o amor humanos: 
Mas tranquila ela sabe, e eu sei tranquilo 
Que se um fica o outro parte a redimi-lo.

(Autor: Vinícius de Moraes)

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