UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Concerto para Corpo e Alma


Só voam aqueles que têm coragem
 para enfrentar a solidão: 
a solidão é amedrontadora. 
Albert Camus me contou que viagem boa
 é aquela que a gente faz com medo. 
Nós, humanos, somos estranhas criaturas:
 gostamos de ter medo.
 Escalamos montanhas, pendurados nos abismos;
lançamo-nos no espaço vazio, confinados em frágeis asas; 
mergulhamos nas funduras do mar, 
cercados de perigos.
 Assim também as viagens - para serem mais 
que deslocamentos  banais no espaço têm 
de ser saltos no desconhecido,
 com todos os calafrios. 
A menina não podia voar porque
 não tinha asas no corpo.
 E não tinha asas na alma.
 As asas da alma se chamam coragem. 
Coragem não é ausência de medo. 
É lançar-se, a despeito do medo.

(Autor: Rubem Alves)

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